Postagens

Mostrando postagens de novembro, 2012

Malfeição poética

E naquela noite preenchida pelo ofício, encontrou-se com seu malfeitor. A despeito de sentir-se gradualmente senhora de si - fato conquistado pelas desconhecidas vias da sedução sucedida a cada sessão com seu analista -, a mulher, por ora menina, se fazia de donzela para com seu corcunda de Notre-Dame moderno... - Por quê raios isso sucederia?... Seduzida e sedutora, sentiu, repentinamente, naquele mesmo local povoado pela solidão dos chopes gelados e sorrisos espinafrados trajando paletó, um cheiro inconfundível de sexo... cheiro do mais sujo sexo... Na mesa escura, frases de Foucault e o repulsivo odor... de sexo molhado e apodrecido. A menina, fresca, embrulhada em seu chale rosa, seduzida pelo experiente olhar desnudador - que sabia encontrar-se com enigmas sem destruí-los; revelador de profundas meias-verdades; poeta e jogador -, sentia asco da mera lembrança daquela língua, que revelava seu escuro propósito sendo língua... invasiva, dura, hélice de helicóptero, que; tritura

Oroboro

Imagem
"Na verdade, somos uma só alma, tu e eu. Nos mostramos e nos escondemos tu em mim, eu em ti. Eis aqui o sentido profundo de minha relação contigo,  Porque não existe, entre tu e eu, nem eu, nem tu." Rumi O vento dança, contorna, espalha e movimenta a nau da vida nessas turbulentas águas, afasta o que a natureza bruta esculpe... o amor por si talhado... mãe e filha... Me cospes e mastigas a própria cauda... me adapto. Nesse mundo oco das luzes que cegam e nada significam existe amor porque existe separação. Se oroboro fossemos, não nos amaríamos, não existiríamos... Seríamos eu em você, você sendo eu... uma só alma. nem boca nem ventre... vida. Odeio-te como dom, pois não mais circunscrevemos... Separadas, somos ingratas partes que servem para acordos, leis e a moralidade. Nesse universo seco, odiar-te é imoral amar-te ao avesso, irreal. Agora algo tenho de ser... sobreviver... serpenteio. me adapto. pois sou passageira. filha raptada pelo ve

Entorpecência torpe

Nosso encontro nada tinha de divino Encontro desencontrado, por falha do destino. E por assim ser, nos comíamos, nos devorávamos... Veneno latente e buraco... Consciência do fim já no primeiro abraço Encontro urgente de olhos cansados e bocas dormentes... entorpecente o fim que pautou seu começo e definiu os meios da gente... Consciência inconsciente não fosse, não nos faria céu brilhante, posto o inferno que somos quando teimamos de ser dois... Desafiamos o destino que, escarnecido, por fim nos fez um brinde: Que amor natural assim fosse!... a anti-matéria ilógica, o anti-eu, anti-nós, destrutível, destruidor, destruídos... nós.

Um dia, nós...

Éramos uma cidade, soerguida sem arquitetura, sem pedras e sempre amedrontada e ameaçada pelo intenso fluxo do mar... O tempo ainda não teve tempo de fazer a sua curva e o fim assim se impôs pelo pedreiro da destruição que não soube duelar consigo mesmo... Aonde, só, construístes um muro, formou-se, pois, uma muralha... pois partistes de malas e cuia de dentro de mim residindo agora aqui um eu sozinho, pleno dos escombros do um dia nós... Nessa cidade, construída e destruída, movimentada pelo fluxo do mar e governada pelo ciclo lunar, originou-se uma criatura de alma escura, pois amor vem de dois ela era uma... fêmea de seu "lar". Figura androide, ora solar, ora neblina intimidada, enfurecida, reacionária, sentimental... ao avesso, sem governo, sem si por não ter o nós... carente daquele olhar destrutivo para que se destrua a si mesma e do mesmo amor destrutivo que lha reconstrua no encontro divino dos encaixes perfeitos... Sem o ti, como reconstruir o si?

É o movimento que cria a forma

Inundar a existência com essa maré desconhecida não é fácil não... Essa imersão nessas águas escuras; fluidos nossos, que nosso mundo repulsa; extravasa até a nossa visão, e no mundo que a gente ocupa, pedaços nossos perigosos, catastróficos, sem racionalização... Basta que se abra uma porta para que o que nos era cômodo passe a incomodar, para que o que nos obedecia se desgoverne da gente e lá estamos nós, submersos, dançando a dança macabra do inconsciente, de tambores secos, de vestidos negros, de ladainhas entoadas sem língua, sem gente... Tudo sai do seu lugar e já não somos mais os mesmos... Ver a cara de Hades em cada olhar que se apresenta e... jaz o rompimento do hímen da nossa consciência!... Se diluir em pedacinhos não é pra qualquer Perséfone... Que venham os céus e infernos da gente que eu cedo, como já cedi aos estupros no divã da minha própria escuta, pois que sou porque estou em movimento. Que se diga ao vento: Sei dançar valsa, também sei dançar cumbia!

Tom de cinza

Numa tirada de baralho, foi você quem me escolheu. Sem blefe, foi você quem renunciou... Em ti sempre fui coisa, bibelô. Como despertenço agora se no meu corpo e na minha alma ainda reside o seu jogo?... Ninguém nunca soube o por quê de minhas tantas cores se diluírem no seu tom de cinza mas pra falar a verdade, só queria ser assim coisa pra ser sua coisa possuída, coisa que caminha pra ser coisa despertencida, porém, ainda delimitada demarcada pela sua geografia...