Os olhos de Bisa
Teceu teceu teceu teceu... Não alinhavou.
Perdeu no horizonte os olhos à espera do seu santo guerreiro, que arremate o único ponto que não pôde dar na vida. A despedida...
das dores sustentadas naqueles ombros dedicados à costura da vida dos meninos, filhos de Jorge.
Matriarca, costureira, amazona, orgulhosa, prosa... Contadora de histórias,
quem teceu em mim o primeiro fio da narrativa... Entorpeceu-me de palavreados.
Eu copiava. Escrevia quando ela bordava.
Bordava e ela contava... Criávamos vida em tempos mortos...
Outra semana prometeu jamais voltar à máquina de costura, seu sentido...
O rosto então caiu; baixinha, apequenou-se mais ainda; teve preguiça.
Retaliou São Jorge. "O que ele espera pra me levar?"
"Só vou de cavalo branco!". "Chegou minha hora".
E chegou. Dos noventa outonos, tantas Luas, mangas-fruta maduras, luta e criação, desgostou da comida.
Parou de assaltar a geladeira nas madrugadas - como juntas fazíamos - entre a leitura do salmo 91 e suas histórias de Sertão...
Ai, meu tão íntimo Lampião!...
No Musee D´Orsay estive com os olhos de Bisa.
Sei que com eles hei de andar toda a vida...
Vai criar no céu a minha menininha inventiva, pratear as nuvens com seus cabelos - sabedoria.
Trançará em minh´alma letrada, canção...
Que emoção! A senhorinha arretada de 90 anos cantou-nos seu recado... Registrado! Relícário! Última poesia de quem vive e se alimenta do que cria. É o relato de uma recente paixão...
ResponderExcluirHei de criar também! Tenho é juízo de não fugir à minha ancestralidade!!
" Você é um homem casado
Um homem potente,
que dorme com a gente,
dentro do meu coração.
Se você não fosse casado
eu faria uma morada
dentro do seu coração.
Se a Lua não fosse casada
com um homem tão potente
que dorme com a gente
dentro do meu coração..."
Dona Helena Salomão
(setembro de 2013)