Estranho hóspede
Esses dias conheci alguém que trouxe para morar na minha casa, que me desalojava a cada dia, a cada palavra que de mim saía... Eu expunha, dizia, pois trabalhara o projeto de construir a ponte que ligasse os pólos da gente que se perdia...
Só havia o silêncio. Então comecei a preencher os espaços...
Lhe contei do meu passado, lhe pus a par das minhas feridas e, a cada frase à ventania, objetos da minha casa sumiam...
Primeiro os lençóis da cama, depois o envoltório do colchão. E as malas... - Já não podia partir...
As horas passavam, os dias, as coisas, e mais e mais eu me apegava àquele estranho distante, que comeu da minha comida.
Por último, se foram as chaves de casa... Como sou desajeitada! Uma pária...
Fiz-me então não-presença, só pra não desconfortar...
... Palavras íntimas dentre nuvens negras são corrente arquitetada de afeto.
... Ontem chorei detrás da cortina. Chiquitita de mim...
Nunca mais tive casa desde a necessidade de amar e ser amada que sempre se apossara de mim...
Já perdi um amor assim... - Sem sequer sabê-lo ter tido - por palavras compartilhadas em ouvidos de trompete...
Eu sei. Olhares espaçosos sempre me acompanham... Mas eu não tenho nada, tampouco tenho a mim...
Porque minha alma é fluida e escorrega quando acordo (sempre) nua - para que te mantenhas aqui...
Sinto que nada me cabe, sequer saber o por quê me malfeito ou me travisto assim... Sei que hoje sonhei com um estranho homem, que me amava sem meu querer. Senti medo. Senti dor...
Quando acordei, assustada, as gavetas... abertas, sem o envelope com o dinheiro do aluguel.
A porta do quarto... escancarada. E eu... em posição fetal, na ponta do colchão...
Olhei para o lado... um cobertor embalado...
Sorri.
Eu já não tenho mais nada...
- Você estava aqui.
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