Ela

 

O coração ainda sangra

E a Vida vez ou outra ainda espeta 

A Dor só quer saber-se viva, renitente.


Ventou, passou água fria, água quente...

Coração sangra

E ela me sorri orgulhosa e sem dentes.


Alimenta-se da minha ferida,

Oh, cruel parasita!

Não sou eu a louca da casa?


Meu Deus, tira esse rato da minha mesa! 

Mas minha prece não percorre a Terra, 

não sabe subir até Deus. Ecoa.


Não vês que acabou a festa?

E passou o tempo, passou o vento 

e a vassoura nos pés dela.


Como um jumento que empaca,

Fomos da sutileza aos pontapés,

no tapete da sala.


E a Vida piadista, que não perdoa, 

ainda espeta.

Mais ela sangra na minha janela,


e na mesa de jantar,

e na frente dos convidados,

e no banquete principal,


Me espanta.

Já pus até no colo, 

Admirando-a como a uma criança, 


mas é ingrata, não se consola e me fere.

Eita que dói e não pára, 

me desonra e desobedece!


Lavei as minhas mãos

Mas ela, então, lacrimosa e sem dentes,

permanece.

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