Circunvoluções
Hoje eu padeço porque calo o fluxo de alma, tamanho padecer que atirei no mar uma pedra da garganta. Pedra vi ressoar por cinquenta metros de circunferência. Da mesma maneira que observei a respiração invisível dos peixes pela superfície, suas borbulhas, coitos, partos e a circunferência projetada, quis abrir uma concha sofrida no núcleo da minha existência.
Pensando bem na concha, recordei de algumas pegadas do passado. Me lembrei de um louco, doido varrido, que cantava desafinado, alto e descompassado, desgrenhado, besta o necessário para ser feliz nessas circunvoluções do Tempo, ele costumava ser meu namorado. De algum modo raro, sempre fui dessas de atrair loucos e assumir deles as consequências.
E foi a essa imagem que atirei pedra, porque pedra eu não sabia declamar. Eu tinha ido para a beira do rio para abrir-lhe a minha concha, mas acabei lhe atirando pedras e engoli a pérola, logo o mar ficou descompassado nas voltas do vai-não vai, nas voltas do foi que vem, do foi que é ainda, do será que não vem.
- E essas voltas enlouquecedoras, ensurdecedoras que o espelho-d´água fez na pedra que atirei? - Mil passos circundam o meu ser cansado naquelas mesmas paragens de outrora. Ciclos do tempo, ciclos do vento, ciclos da geração, ciclos da compreensão. Coração no divã quase endoidece.
Retorno para a beira, atiro uma pedra que ressoa no rio, e - glup! - vi a minha vida agitada pelo seu telefonema. Lembrei dos muros que nos separavam, da minha velha insistência. Ainda sou teimosa como a água! Contemplando de pertinho, fiquei com medo das palavras - mas eu queria dizer, pedras, - e ainda procuro essa pérola que me escapa incessantemente.
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